Aquele que vê o espantoso esplendor do mundo é logicamente levado a ver o espantoso sofrimento do mundo. Aquele que vê o fenómeno quer ver todo o fenómeno. É apenas uma questão de atenção, de sequência e de rigor.”
Sophia de Mello Breyner Andresen, Arte Poética III
É preciso implorar ao Autor pela salvação do mundo. Não há tempo para frivolidades e distrações. Vivemos tempos de anestesiamento, distraídos com coisas que pouco ou nada valem. Relembro, uma e outra vez, as palavras de Santa Teresa: “Não durmais/ porque não há paz sobre a terra“. Estaremos a dormir? Se sim, teremos alguém que nos desperte desse torpor? Andaremos satisfeitos com as pequenas coisas da nossa vida: “Comiam, bebiam, davam-se em casamento, até que caiu sobre eles aquele dia.“?
Hoje leio que o médico Gustavo Carona que tem uma doença degenerativa e que só deitado se alivia a sua dor. Ontem, um avô matou a neta com uma faca. A semana passada uma adolescente espanhola, perto de Barcelona, foi violada na casa de banho de um centro comercial por menores, que filmam e publicam. Eu não posso resolver estas situações mas elas têm uma “linguagem”, obrigam-me a tomar posição. Consigo arrumar o sofrimento num canto e continuar com a minha vida? Tenho as minhas prioridades calibradas? Não quero viver numa redoma de auto proteção mas não sei bem como viver.
“Ensina-me a viver”, diz a canção. Talvez seja isso.