Naqueles dias, a rainha Ester, tomada de angústia mortal, procurou refúgio no Senhor e fez esta súplica ao Senhor, Deus de Israel: «Meu Senhor, nosso único Rei, vinde socorrer-me, porque estou só e não tenho outro auxílio senão Vós e corre perigo a minha vida. Desde criança, ouvi dizer na minha tribo paterna que Vós, Senhor, escolhestes Israel entre todos os povos, e os nossos pais entre os seus antepassados, para serem a vossa herança perpétua, e cumpristes tudo o que lhes tínheis prometido. Lembrai-Vos de nós, Senhor, e manifestai-Vos no dia da nossa tribulação. Fortalecei-me, Rei dos deuses e Senhor dos poderosos. Ponde em meus lábios palavras harmoniosas, quando estiver na presença do leão, e mudai o seu coração, para que deteste o nosso inimigo e o arruíne com todos os seus cúmplices. Livrai-nos com a vossa mão; vinde socorrer-me no meu abandono, porque não tenho ninguém senão Vós, Senhor».
Livro de Ester 14,1.3-5.12-14.
A nossa fé é cerebral, calculista e desconfiada. Somos reis do nosso imaginário reino. Quando somos tomados de angústia, viramo-nos para as nossas forças: eu resolvo, eu consigo. Não suplicamos, negociamos. Não pedimos socorro, mas dizemos “o céu é o limite”. O nosso auxílio? A minha vontade, as minhas capacidades. A minha força? O orgulho, que me leva onde quero, que importam os outros!
A rainha era rainha mas o seu reino era a humildade, o húmus da terra, a suprema sabedoria de saber que ela era da terra e o seu Deus do céu. Era poderosa, mas diz ao seu Rei: socorre-me, auxilia-me, lembra-te do teu povo, fortalece-me. Quebrada, balbucia: não tenho ninguém senão tu.
Atrás da porta, o homem astuto de dois mil e vinte e três, o homem do tempo da inteligência artificial e dos multiversos, ri de Ester. Mas, naquela tarde, quando o sol se punha sobre campos e mares, na vida dessa mulher, subia como fogo, como labaredas avassaladoras, a confiança no Deus de Israel. E Ester será modelo de entrega e de fé. O nosso contemporâneo, que espreita sem nunca se comprometer, perder-se-á em subtilizas argumentativas enquanto ouve o tilintar do gelo no copo.