
Uma das séries que mais gostei foi “Dexter”. Dexter Morgan trabalha na polícia e tem acesso a informação privilegiada relativa os criminosos sob investigação. Em criança ficou marcado ao ver a sua mãe ser assassinada. Essa experiência fez crescer nele o que chama o seu “dark passenger”, uma força irreprimível e poderosa para matar. Tendo consciência do que se estava a desenvolver no filho, o seu pai iniciou-o num “código”. Com a aprendizagem desse código, Dexter aprenderá a canalizar a necessidade de matar segundo as regras desse mesmo código: pessoas que comprovadamente cometem crimes graves e que envolvem a vida, a saúde e a felicidade de outras pessoas.
Esta série levanta questões interessantes.
1 – Dark passenger”. O protagonista tem dentro de si uma força irreprimível para fazer o mal. Não a temos nós também, ainda que em grau soft? A diferença será de essência ou de grau? Onde está a linha vermelha entre a sanidade e a patologia? Os comportamentos perturbadores e violentos que são socialmente reprováveis são catalogados e isso descansa-nos: ‘eles são doentes nós somos sãos’. No entanto, o dark passenger é bem mais insidioso do que podemos julgar.
2 – Justiça. Não sei o que pensa o estimado leitor, mas a perspetiva de alguém ser uma espécie de “vigilanti” agrada-me e só os “pensamentos conformes à moral e aos bons costumes” abafam este desejo de que “ao menos haja quem limpe o sebo a esses criminosos já que a polícia não faz nada”. Percebo pouco da moral vitoriana, mas intuo que o grande problema era o verniz colocado sobre o vulcão das pulsões inconscientes e subterrâneas. Esta série obriga, de forma honesta, a perceber que, debaixo dos raciocínios lógicos, racionais e até religiosos, há um outro piso onde a violência, o ressentimento, o medo, a culpa, a agressividade, moram. Ninguém é apenas racional. Cuidado com o leão escondido!
3 – O bem e o mal são lugares inamovíveis? Fazer justiça pelas próprias mãos é errado até onde? Há alguma justiça neste justiceiro que mata apenas quem tem a certeza que é criminoso, (aspeto que nunca é beliscado ao longo de todas as temporadas)? Há alguma compreensão para Dexter por ter visto a mãe ser assassinada à sua frente num banho de sangue?
Enfim… perguntas difíceis para respostas difíceis. Certeza nos princípios, mas a vida não é a branco e preto e, muitas vezes, temos de avançar às apalpadelas. Desconfia de quem tem demasiadas certezas, ó leitor.