
Excesso de realidade
Será hoje o mundo mais violento do que foi no passado? Haverá hoje mais pobreza ou mais sofrimento do que no passado? Eu não estou certo de que assim seja e não estou certo que assim não seja. Existe hoje muita informação disponível que quantifica o nosso progresso como humanidade. Sei que a informação é controvertida e polémica e pode ser mal usada e interpretada. Dizem que nunca vivemos tão bem como hoje.
Se assim é, por que razão tenho uma perceção tão vívida do sofrimento e da presença do mal no mundo, de tal forma que aprece ser a única realidade? Chamo a isso um “excesso de realidade”. Hoje não existe qualquer espécie de mediação entre o espaço, o tempo e a “quantidade” de informação sobre o que se passa no mundo e a existência pessoal de cada pessoa. Podemos estar tranquilamente a ver um meme ou um vídeo e, de repente, ao fazer scroll, aparece um vídeo sobre uma tragédia de uma criança.
A nossa postura de compromisso e vigilância com o que se passa no mundo não pode significar estar em permanência exposto a tudo. Deve ser filtrada e mediada. Não é saudável nem mesmo justo que sejamos expostos a essa torrente, a qual tem subjacente, infelizmente, um negócio. Desta forma, fecham-se as portas a toda a beleza e heroísmo dos quais estão cheios os dias de tantas pessoas. Como em relação a tudo o que nos chega pelos sentidos, moderação e justa medida são princípios universais. Esse “excesso de realidade” pode ter o efeito perverso de provocar em nós medo, ansiedade e, no limite, uma paralisia na nossa ação.
Vejo isso acontecer na chamada “ansiedade climática” que invade muitos jovens. Precisamos lutar, mas com um coração forte e reconciliado. O sofrimento e o mal devem ser percebidos e combatidos mas não podemos deixar que nos façam submergir e paralisar.