Toda a nossa vida não é mais que um sopro

Toda a nossa vida não é mais que um sopro, diz o Salmo. O sopro é, como afirma o poeta “leve, breve, suave”. A minha vida é como um sopro porque passa rapidamente. Aos quinze, vinte anos sou eterno e a vida é infinita. Dobrados os cinquenta anos assusto-me com a rapidez com que os dias se sucedem; e quem diz dias, diz semanas, tempos, eras. É mistério insondável como consigo viver tão alheado e desconfiado desta verdade que me atinge como uma lança: é breve a minha passagem por este mundo. Pior: durante a previsão que faço do que será a duração dos meus dias, não há nada que me garanta que o fio se parta aqui ou ali. E, no entanto, consigo viver num delírio inconsciente de omnipotência repetindo o mantra de que tudo correrá como planeado.
A verdade é que já o salmista dizia: “o homem que vive e não reflete/ é semelhante aos animais que são abatidos”. É necessário, portanto, refletir. E refletir será, entre milhares de outras coisas, ganhar um pouco de distância face à realidade; fazer um “zoom out” relativamente aos meus dias; perceber que a contingência e a imprevisibilidade me acompanham como uma sombra. Sei que já escrevi neste blogue, mais de uma vez, sobre este assunto, mas ele não deixa de me inquietar – não será tanto o receio do que e do quando algo me possa acontecer, mas, sobretudo, desta “dura cerviz”, desta teimosia, que insiste em não querer aprender com o passar do tempo e com os apelos que os acontecimentos vão “falando” à minha vida.
Como será a vida do ser humano que incorporou no seu sangue a verdade de que a nossa vida é como a erva que passa? Será essa pessoa deprimida ou alegre? Enfastiada ou apaixonada? Indiferente ou ardente? Penso que essa pessoa será incrivelmente apaixonada pela beleza da vida, das pessoas, pelas contingências, aventuras e desventuras de cada dia. Vive com um sentido de urgência e de provisoriedade que a faz não ter tempo a perder. Por vezes, sabemos de figuras mediáticas que tiveram essa perceção muito clara de como o tempo da sua vida era breve e queriam viver como quem bebe um copo de água sofregamente.
Como passamos do sonâmbulo ao vivente? Seguramente que não é deixando a coisa rolar, vamos indo e vamos vendo… Há trabalho a ser feito, caso contrário, a nossa mente se encarrega de nos manter na mentira. Os filósofos e pensadores falavam da necessidade de refletir, pensar, meditar; as diferentes tradições religiosas acentuam a importância da escuta de palavras sábias, a reflexão e a oração – tudo formas de nos aproximar da verdade das coisas, e habitar o tempo libertados.

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