
O bem e o mal sempre existiram e fazem parte da nossa condição humana. Fazemos o bem e também o mal e sabemos que o bem é bem e o mal é mal. O que para mim é assustador é quando se faz o mal sem saber que é verdadeiramente o mal. Sinto que nos tempos que vivemos, não só o mal parece falar mais alto, como o bem parece ter ficado sem voz.
Isto vem a propósito da violência e intolerância do discurso público: sejam responsáveis e líderes de vário tipo, sejam os utilizadores anónimos das múltiplas arenas com visibilidade social, há cada vez mais uma atitude no discurso que resumiria em duas palavras: tribalismo e entrincheiramento.
Tribalismo porque as opiniões tendem a agrupar-se em grupos fechados, intolerantes, com a convicção de serem detentores da verdade. Todos os outros estão errados e devem ser alvos a abater. Como numa guerra de trincheiras, abrigamo-nos e atacamos a partir do buraco em que estamos. Sinto uma violência incomum, tão agressiva quanto considerada quase como o “novo normal”. Eu sei que o mundo também está repleto de gestos e vidas anónimas carregadas de bondade. Há tantos milagres de bem, de amor, de vidas doadas a favor dos outros! No entanto, no fragor das batalhas parece que a criança com a flor na mão se some terra adentro.
Creio que esta avalancha escura e tenebrosa possa perturbar muitas pessoas: o que é o bem, o amor? Haverá lugar para ele quando a força, rapidez e disseminação do mal parece tão presente?
Quando num namoro de jovens se chama “amor” à violência praticada de um sobre o outro, terá a parte ofendida a perceção de que aquilo não é, não pode ser efetivamente amor? É que se não têm essa perceção o problema é bastante mais grave.
Por onde caminhar, por onde rasgar caminhos novos? Como tornar a beleza, a educação, a filantropia, o amor, a amizade, audíveis e visíveis no meio de tanto desamor? Como poderemos trazer todos esse gestos e vidas de prática do bem até ao coração da maldade? Deveremos começar por nós mesmos, pacificar as nossas raízes mais profundas? Não sei bem… sei que, qualquer se seja a perspetiva ou o quadrante de vida, viver é combater. E há um combate a travar em nome do bem. E combater é atuar, estar alerta, tomar partido, avançar e recuar, juntar-se a outros. Santa Teresa de Ávila escreveu:
Ya no durmáis, no durmáis,
pues que no hay paz en la tierra.
No haya ningún cobarde,
aventuremos la vida!