Ainda a meditação

Estou feliz pelo caminho que começo a percorrer – refiro-me à minha vida espiritual ou contemplativa.
Comecei a meditar de uma forma regular no mês de agosto de 2020, portanto vai para oito meses. Até então, a minha vida espiritual estava num limbo, presa dos meus estados de espírito, desamparada e só, sem lugar onde aportar, sem comunidade onde lançar a âncora.
Já tinha iniciado um caminho de aproximação aos padres Carmelitas e aí tenho sido acolhido, tratado pelo nome e envolvido na dinâmica comunitária. Andava errante e, francamente, desapontado com as comunidades paroquiais por onde fui espreitando. Se quiser ser mais contundente, é clara para mim a profunda crise e esclerosamento da vida cristã comunitária, apesar de alguns poucos excelentes exemplos.
Com a aproximação à Comunidade Mundial de Meditação Cristã, fechou-se um novo círculo de pertença, desta vez mais pequeno e, portanto, mais próximo da alma. Com esta comunidade de meditadores, tornei-me fiel a uma regra diária de oração/ meditação/ contemplação: vinte e cinco minutos de manhã e ao final do dia. Nada de “blá blá” religioso – simplesmente entrar numa dimensão inaudita de procura.
Admiro os meditadores da comunidade. Todos os dias, sentar, fechar os olhos, aceitar ser vergastado pelo ciclone ininterrupto dos pensamentos, arrimados à oração monológica, até que se abra um caminho para a clareira do Nome. Vivi na vida religiosa, vi alguma gente reta e serviçal, mas vi muito pouca gente colocar a oração e o silêncio diante de Deus como prioridade da sua vida.
Estou profundamente convencido daquilo que outros já disseram: a Igreja ou é contemplativa até aos ossos ou nada mais é que um grupo de gente bem-intencionada que tem na religião um quadro de vida para conforto e justificação.
As propostas de caminho contemplativo que são propostas por John Main, Thomas Keating ou Richard Rhor (por felicidade, três autores que já tinha lido muito antes de me abeirar destas lides) não são uma moda simpática destinada a fazer a pessoa sentir-se bem. Estão profundamente ancoradas na tradição monástica e contemplativa da espiritualidade cristã; dialogam com a tradição mística da Igreja Ortodoxa; recebem influxos do misticismo hindu; servem-se do contributo e dos “insights” da Psicologia. Tudo muito sólido, portanto.
Como podemos tornar a presença de Cristo significativa hoje para outros? E porque há-de ser a presença de Cristo sequer significativa? Para que servem técnicas de animação pastoral, estratégias de evangelização, atividades para cativar os jovens? Nós temos de ser como os padres do Deserto, regressados da solidão, do duro combate com o Nome. Temos de ser pessoas em fogo, profundamente pacificadas; pessoas que não temeram descer ao submundo disfuncional dos nossos impulsos e compulsões destrutivos e egotistas. Pessoas que habitam o silêncio como o seu espaço natural, no qual escutam o murmúrio sob todos os murmúrios, anterior a todos os programas emocionais e existenciais que a vida nos foi incrustando.
Neste mundo da torre de Babel, ser aquele e aquela que desce das Terras Altas e apenas pela sua presença fala de um outro mundo, da palavra que vem do futuro.
É isso que desejo para mim e para a Igreja. Não é isso que sou, sei-o cruamente. Mas caminho, com outros, à procura da fonte de onde jorram todas as bênçãos, esforçando-me como posso por sair do caminho e não atrapalhar.

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