
Toda a gente fala sobre a meditação: o famoso Mindfulness, os diferentes tipos de meditação, a importância da respiração, etc. Não é sobre isso que quero escrever.
Gostava de me centrar sobre um outro tipo de meditação, não a da técnica, da postura corporal, etc., mas antes sobre a meditação discursiva, a meditação que decorrer do ato de refletir, de pensar sobre as coisas, a vida.
Esta reflexão veio à minha memória a partir de leituras e pequenos vídeos que vou consumindo relativamente a uma corrente de pensamento, o estoicismo. Séneca e Marco Aurélio foram dois estoicos. O primeiro escreveu um livro maravilhoso: “Cartas a Lucílio”. Aí, Séneca fornece um conjunto alargado de máximas e princípios ao seu amigo Lucílio sobre uma variedade de temas, mas que se resumem a ajudar o amigo a viver bem, a viver melhor. Marco Aurélio, escreveu o livro “pensamentos para mim próprio”, onde discorre sobre a vida, a morte, o tempo, as relações com os outros, a guerra.
O estoicismo tem como uma das características principais refletir sobre a forma como vivemos, e, por essa razão, não admira que hoje haja um revivalismo dos seus princípios, aplicados a realidades tão imprevisíveis como o mundo empresarial.
O que acho curioso é que para estes autores a meditação é um exercício pelo qual refletimos sobre um qualquer aspeto importante da vida. Esse ato de meditação não é uma reflexão intelectual momentânea que apenas faz “cócegas” à forma como vivemos. Não. Para eles meditar era interiorizar de forma profunda e duradoura uma verdade que tem como consequência alterar a forma como vivemos as nossas prioridades, escolhas e passos. E é este ponto que acho interessante: a meditação sobre uma verdade da vida (por exemplo: “um dia vou morrer”), torna-se não apenas uma verdade intelectual a somar a milhares de outras armazenadas numa das prateleiras da mente, mas antes uma verdade que passou para a “corrente sanguínea” conformando a vida da pessoa. Esta passagem não se faz num momento, mas é o fruto laborioso que se torna operativo depois de a ele se voltar uma e outra vez. A meditação sobre a vida torna-se assim um processo de iluminação projetado sobre os nossos dias: a pouco e pouco vamos acedendo a vislumbres mais profundos sobre o nosso “aqui e agora”. No fundo, vamos abandonando a nossa insensatez e vamo-nos tornando lentamente mais sábios. O sábio é aquele que aprende verdadeiramente com a experiência, transformando a sua forma de pensar. O insensato é aquele que vive sem refletir. O insensato sabe que na vida existem contrariedades e imprevistos, mas quando eles surgem surpreende-se e maldiz a sua sorte. O sábio sabe que vive de forma a contar e a não se surpreender com esse facto inegável que são as contrariedades e imprevistos.
Vivemos normalmente como insensatos. Com sorte, à medida que vamos envelhecendo, vamos aprendendo alguma coisa. Mas devíamos aplicar-nos de forma continuada e aturada a meditar sobre a vida, sobre o que é importante, o que é a realidade, quem sou eu e quem são os outros, e por aí fora.
O vivermos em aceleração permanente é o inimigo mortal da vida interior. É como alimentarmo-nos numa refeição sem ter tempo de mastigar e saborear os alimentos. Sabemos bem o que nos acontece no estômago.
Não é por acaso que os antigos que podiam, e eram uma minoria, valorizavam tanto o ócio: não para a preguiça ou para mandriar, mas porque ele criava a condição para se poder filosofar. É um pouco como as nossas férias: há tempo para que se possa pensar com mais calma.
E essa é uma condição para a nossa sanidade.