Fogo e ossos

Ontem, ao ler um artigo, a dado passo o autor afirma que os cristãos/ deveriam ser um “sinal de contradição” neste mundo. O que significa isso? Significa que um cristão deve chamar a atenção das pessoas à sua volta por algo que o distingue dos outros e que brota da sua fé, da sua relação com Deus. Pode ser a sua alegria, estranha, constante, desproporcionada face aos eventos de cada dia; pode ser a sua caridade com os pobres e marginalizados; pode ser a forma como se relaciona com a comida, sem entrar no desregramento; pode ser uma vida vivida na simplicidade, sem ostentação nem ânsia de acumular; pode ser não querer “jogar o jogo” da fama, do poder, do prestígio social ou eclesial.
O que, definitivamente, não pode ser é que as pessoas à sua volta digam: “não tem nada de especialmente diferente! É um gajo porreiro e tal”, mas não há nada (a não ser talvez uma verborreia sobre Deus e a fé) na vida daquela pessoa que faça disparar o termómetro do Transcendente.
A tradição ortodoxa chama às pessoas “sinal de contradição” os “loucos por Cristo”. A loucura não tem boa cotação: associamos a desvios, excessos, perda da razão. No entanto, a história da Igreja (e poderíamos alargar à História da Arte) está cheia de pessoas a que chamamos “Santos”, canonizados ou não, que irradiaram luz, que foram “provocadoras”, que cindiram as pessoas à volta a favor e contra.
Terei encontrado muitas dessas pessoas ao longo da minha vida? Poucas ou nenhumas. O Irmão Roger, fundador da comunidade de Taizé e o Papa Francisco, como pessoas que não conheço ou conheci pessoalmente, destacam-se como sinais vivos e ardentes do amor de Deus.
Como narra a alegoria do livro do profeta Ezequiel, é preciso um vento novo que desça ao vale das ossadas, para que vidas de fogo incendeiem este mundo e o outro.