






A palavra vem do latim “fides” e tem na sua raiz a ideia de confiança. Confiar significa “fiar-se” em alguém. Esta noção é diferente da noção de fé que existe no senso comum, mesmo entre os cristãos. Aqui, a fé é entendida como o acreditar racionalmente num princípio, num ser, em Deus, como um objeto do pensamento. Acredita-se em Deus de forma não muito diferente da crença que o homem foi efetivamente à lua. Nesta situação, não se pode falar de fé, mas de uma caricatura da fé. Esta crença e o fluir da vida pessoal correm em paralelo como dois rios que não se atravessam. Assim, quando alguém pergunta “tens fé” ou afirma “tenho fé”, isso pode significar coisas muito diferentes.
Quando a fé se relaciona com a palavra “confiança”, algo muda de figura. Confiar em alguém é entregar-lhe algo de próprio e precioso. É desenvolver uma aproximação pessoal, relacional, de intercâmbio crescente, uma relação de amizade.
Pessoalmente, na expressão “ter fé”, não aprecio sequer o verbo “ter”, já de si traiçoeiro: tenho fé como tenho tantas outras coisas na prateleira dos meus haveres pessoais. A questão fundamental é: a quem ou em quem entregas a tua confiança? Confias em Deus, a ponto de com simplicidade partilhares os segredos decisivos da tua vida, aceitando que esse Deus entre na tua vida e a vivas com ele?
O que é ter fé? É esperar, caminhando, à porta do mistério. Aceitar, quotidianamente, ser açoitado na minha indigência pelo absoluto do Evangelho e ainda assim não desesperar de mim. Ser aquele que procura na noite aquele que já me alcançou.
A fé implica uma espera: há uma salvação, uma palavra nova sobre a nossa vida que não provém da nossa inteligência ou das nossas capacidades, mas que recebemos e acolhemos. Esperamos, mas caminhando, aproximando-nos daquele simultaneamente distante e próximo. Caminhamos, mesmo de forma pouco esclarecida, achamos nós; avançando pela sede e pelo amor.
Esta espera, esta sede revelam de forma crua e implacável, a descoberta de Adão e Eva depois de terem comido o fruto: estamos nus, somos pobres e, quando nos vemos sob a luz implacável de Deus, percebemos as nossas disfunções, as nossas fantasias, o nosso medo.
Avançamos, muitas vezes às apalpadelas, sem a certeza da direção ou da conduta. Se entregamos a nossa confiança, porém, sabemos que aquele para quem nos dirigimos já nos alcançou, isto é, a distância já foi vencida.
Dolorosamente, no entanto, vivemos esta confiança “de noite”, sem o conforto da certeza racional ou da validação social. Ficamos suspensos apenas da confiança de uma mão oferecida para o caminho.