Ao fim da tarde

Céu, vento nas árvores. A beleza da luz do sol, que se projeta nas casas e nas ruas, antes da noite cair sobre tudo. Amo a natureza… tanto gostaria de traduzir em palavras a impressão que me causou hoje, ao fim da tarde, o vento a passar nas árvores: que vibração, que estremecimento… Como se despertasse em mim uma nostalgia sem origem. Como se esse vento, as árvores, a luz do sol me ligassem ao que de mais belo e universal o mundo tem.
Em momentos assim, abrem-se portas da memória de par em par: aparecem imagens, sons, momentos da infância que rompem com força, em estado bruto, abalando as determinações do racional: aí está esse percurso que fazia a pé entre a casa dos meus avós e a dos meus pais; aparece a lembrança de tantos e tantos dias em que a casa dos meus avós era um templo de serenidade, de paz, de frugalidade e de amor.
As portas da memória… elas abrem-se também quando leio poesia. Nesses momentos, o pensamento binário, os juízos de razoabilidade, o calculismo e o deve-haver próprios de cada dia, desvanecem-se… a poesia instaura uma lógica que pertence ao domínio do errático, do impulso, do inconsciente. E que bem sabe quando uma palavra ou um verso me levam, sem obliteração racional, diretamente a uma memória, ela mesma soterrada desde há muitos anos. Como, se, de repente, do nada uma janela se abrisse e esse vento nas árvores me acordasse para um outro mundo quase sempre escondido sob este mundo.
É pobre a vida sujeita às determinações do racional. Desaparece o mundo do fantástico, dos sonhos, dos impulsos do inconsciente.
R. M. Rilke disse que as coisas mais importantes no nosso mundo interior se passam numa região onde a palavra nunca chegou.

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